quantos indecisos andam agora por aqui

Tuesday, October 24, 2006

Quem mais sofre...

Já está mais que dito que, no meio de tragédias, quem mais sofre são as crianças. Hoje pensei sobre isto, a propósito de coisa nenhuma. Foi um daqueles pensamentos que nos assolam de vez em quando que surgem no vácuo da mente e espicaçam a concentração. Não costumo pensar nisto, talvez porque me deixo levar pelo sentimento de injustiça e fico mal depois disso...
Mas, todos os dias passo por sítios desgastados pela pobreza e todos os dias tento desviar o olhar, mas não consigo e trespassa-me o coração ver as crianças a brincar no meio de lixo ou com maus tratos (domésticos ou decorrentes da própria vida de miséria) que se notam à vista.
Custa-me muito, mas calculo que a eles custa mais, ou mais tarde ou mais cedo, vai custar.
Aqui há dias encontrei um miúdo, que devia rondar os 12 anos, a mesma idade do meu irmão, vestido de forma diferente de todos os outros miúdos da mesma idade. A pele curtida pela pobreza, a roupa gasta e o mesmo olhar triste que já vi em outras crianças e mesmo naqueles miúdos que aparecem nas fotos das revista, representando a miséria social. Eu estava na fila do supermercado, com um carrinho quase cheio e ele à minha frente, segurando um saco de pão. Eu olhei para o carrinho e apercebi-me que não precisava de metade das coisas que tinha lá. Não voltei para trás, para repor o que não precisava, talvez numa atitude comodista, mas prometi a mim mesma tentar fazer alguma coisa.
E lembrei-me de uma coisa que a minha mãe sempre me disse e a que eu raramente prestava a devida atenção. Recordo-me de a ouvi dizer, várias vezes, quando eu era pequena e deixava comida no prato, que devia comer tudo porque havia muitas crianças no mundo que ansiavam por uma pequena parte do que eu ali tinha. Até hoje penso nisto. A minha mãe também, porque foi ensinada num colégio rígido e até hoje tenta não deixar uma migalha no prato. Pode ser uma obrigação moral, mas até faz sentido... antes servir para alimentar do que ir parar ao lixo. E espera-se que esse alimento nos dê forças para lutar contra a pobreza.
Continuando o meu devaneio inicial, de vez em quando cruzo-me com o mesmo miúdo e tenho sempre o mesmo sentimento de impotência e ao mesmo tempo, o de querer fazer mais pelo mundo. Por vezes, em vez da cara dele, vejo a cara do meu irmão ou coloco-me no lugar da sua mãe...
A injustiça é um dos piores sentimentos que existe...

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