Já está mais que dito que, no meio de tragédias, quem mais sofre são as crianças. Hoje pensei sobre isto, a propósito de coisa nenhuma. Foi um daqueles pensamentos que nos assolam de vez em quando que surgem no vácuo da mente e espicaçam a concentração. Não costumo pensar nisto, talvez porque me deixo levar pelo sentimento de injustiça e fico mal depois disso...
Mas, todos os dias passo por sítios desgastados pela pobreza e todos os dias tento desviar o olhar, mas não consigo e trespassa-me o coração ver as crianças a brincar no meio de lixo ou com maus tratos (domésticos ou decorrentes da própria vida de miséria) que se notam à vista.
Custa-me muito, mas calculo que a eles custa mais, ou mais tarde ou mais cedo, vai custar.
Aqui há dias encontrei um miúdo, que devia rondar os 12 anos, a mesma idade do meu irmão, vestido de forma diferente de todos os outros miúdos da mesma idade. A pele curtida pela pobreza, a roupa gasta e o mesmo olhar triste que já vi em outras crianças e mesmo naqueles miúdos que aparecem nas fotos das revista, representando a miséria social. Eu estava na fila do supermercado, com um carrinho quase cheio e ele à minha frente, segurando um saco de pão. Eu olhei para o carrinho e apercebi-me que não precisava de metade das coisas que tinha lá. Não voltei para trás, para repor o que não precisava, talvez numa atitude comodista, mas prometi a mim mesma tentar fazer alguma coisa.
E lembrei-me de uma coisa que a minha mãe sempre me disse e a que eu raramente prestava a devida atenção. Recordo-me de a ouvi dizer, várias vezes, quando eu era pequena e deixava comida no prato, que devia comer tudo porque havia muitas crianças no mundo que ansiavam por uma pequena parte do que eu ali tinha. Até hoje penso nisto. A minha mãe também, porque foi ensinada num colégio rígido e até hoje tenta não deixar uma migalha no prato. Pode ser uma obrigação moral, mas até faz sentido... antes servir para alimentar do que ir parar ao lixo. E espera-se que esse alimento nos dê forças para lutar contra a pobreza.
Continuando o meu devaneio inicial, de vez em quando cruzo-me com o mesmo miúdo e tenho sempre o mesmo sentimento de impotência e ao mesmo tempo, o de querer fazer mais pelo mundo. Por vezes, em vez da cara dele, vejo a cara do meu irmão ou coloco-me no lugar da sua mãe...
A injustiça é um dos piores sentimentos que existe...
No comments:
Post a Comment