Noites...

Vou quase sempre aos mesmos sítios e vejo quase sempre as mesmas pessoas, aquelas que, de dia, passam por mim nas ruas, junto com as suas vidas atarefadas.
Parece que de noite, todos nós temos as nossas realidades alternativas, as nossas conversas interessantes, os nossos lugares de culto, as nossas longas noites de convívio com outras pessoas que vamos conhecendo por aí.
Olhamo-nos, como se nos tivéssemos conhecido em qualquer outro lado. No fundo, nunca nos falámos, nem trocámos ideias [apenas sorrisos confusos ou ergueres de sobrancelha desconfiados]. Mas é quase como se pertencêssemos todos a esses lugares onde nos encontramos. Como se, de alguma forma, fizéssemos parte da mobília, ou representássemos um quadro muito mais do que decorativo, naquelas enormes paredes de alternativas semi-escondidas.
Nunca vi ninguém, nesses lugares, recusar lume para um cigarro, um sorriso a quem precisa ou mesmo uma conversa que começa apenas com "Tenho a impressão de que já nos conhecemos". Sim, passamos pela mesma rua todos os dias de manhã, mãos nos bolsos, cara fechada ao vento frio matinal, talvez a tomar um pequeno-almoço atribulado de dentro de um papel pardo comprado nalguma pastelaria. Até podemos parar nos mesmos semáforos, esperar os mesmos segundos. Mas são apenas essas as coisas que temos em comum. Depois, cada um tem a sua rotina ou pseudo-rotina e cada um tenta cumprir os seus objectivos ou os objectivos que lhes impuseram.
No entanto, de noite, o dia começa, mas de outra forma. Os jantares e o sentar à mesma mesa. O conversar e desabafar sobre o dia. Aqui ou noutro sítio qualquer. Por vezes, podemos levar essas conversas para o restaurante mais barato e mais perto de casa. Mas as conversas tomam o mesmo rumo, como se o rio tivesse apenas mudado de leito. Acabamos sempre por rir ou por chorar, ou por olhar para o céu com aquele ar de quem divaga por si próprio.
São estas as noites que não quero esquecer.

"Happiness is a sad song..."