quantos indecisos andam agora por aqui

Sunday, November 11, 2007

Silêncio, por favor...

Tic tac, tic tac, tic tac.

Páro e tento escutar o silêncio.

Vozes, sussurros, suspiros. Sonhos acordados.

Tento respirar sem fazer barulho. Mas o ar que se esfuma à minha frente, como um fantasma amaldiçoado por nunca poder tocar o chão, parece retinir. Os átomos de oxigénio são como sinos, pequenos sinos que chocam, uns contra os outros sem parar.

Os meus passos fazem eco. Um, dois, três, quatro. Cinco passos e sinto trovões dentro do crânio. Uma pedra rebola e parece que a sinto dentro de mim.

Nunca mais chego, nunca mais a calçada carcomida pelo gasto termina e piso os degraus da entrada. Nunca mais sinto o calor que vem lá de dentro, nem vejo os sorrisos que me recebem.

Uma buzinadela. Um chorrilho de palavrões. Conversas de esquina, da esquina que está do outro lado da estrada, mesmo dentro do meu ouvido. Zumbindo, zumbindo. Um avião que passa vibra o som na minha direcção. Folhas de árvores, empurradas pelo vento, o grito quase surdo dos semáforos, a borracha dos pneus no asfalto. O calor das luzes que parece conversar com os pássaros que descansam nos seus poisos. O arrulhar dos pássaros, que já não parece uma melodia. A porta do camião das mudanças. Uma criança que grita. Uma senhora que deixa cair as compras.

Silêncio, silêncio, silêncio. Peço para mim própria, como se a vontade pudesse romper com a realidade que me rodeia. Quero desligar por completo o volume das coisas.

Parar, fechar os olhos e escutar o mundo sem som. Tapar os ouvidos e deixar os pensamentos virem ao de cima. Flutuar no silêncio, em vez de me afundar no ruído.

Silêncio. Silêncio. Silêncio. As próprias palavras ressoam nos tímpanos e vão contra mim própria como um ricochete de vibrações.

Por que não posso deixar-me engolir pelo silêncio que há em mim? Perder-me na imensidão de ausência de som… Por que não posso deixar-me levar pelo silêncio até me fartar de não ouvir a tua voz?

Não quero risos, nem o das crianças. Nem quero canções de embalar, nem murmúrios, nem o gritar das palavras dos bilhetinhos dissimulados pela vergonha. Também não quero que me digas que está tudo bem e me sopres no pescoço. Até o soprar faz ruído e parece um eco sem fim. Vai e volta. O som e tu.

Quero ouvir os meus próprios pensamentos. Eles falam baixinho, mais baixinho do que o ar. Quero ouvi-los e deixar-me ir. Ouvi-los, apenas. Não preciso que os vejas para depois me contares os seus segredos… eles falam por si.

Por que não posso desligar tudo e fechar os olhos? Por que não posso apagar o ruído?

Oh, por que não posso não falar sem que me perguntes se está tudo bem?

"Happiness is a sad song..."

6 comments:

Anonymous said...

Sentes-te inspirada?
Este texto faz-me lembrar a conversa que tivemos. Não posso deixar de referir que, por mais que queiras, vai ter que admitir que te consegues deixar levar completamente pelo silêncio. A vontade parece ser muita, mas sei que depois não consegues que ele se apodere de ti.

Mas gostei, gostei muito do que escreveste, das metáforas dissimuladas (quero que depois me expliques cada uma delas), das metáforas que estão à vista.
Mas principalmente gostei dos teus sonhos aqui expostos...

Anonymous said...

Luna, adorei. Fiquei quase sem palavras... mas também, o que tu queres é silêncio, e isso eu posso dar-te...

Anonymous said...

"Não quero risos, nem o das crianças. Nem quero canções de embalar, nem murmúrios, nem o gritar das palavras dos bilhetinhos dissimulados pela vergonha. Também não quero que me digas que está tudo bem e me sopres no pescoço. Até o soprar faz ruído e parece um eco sem fim. Vai e volta. O som e tu."
Gostei especialmente desta parte, porque sei do que se trata (tudo o resto é-me demasiado abstracto)...
Por vezes silêncio e espaço é tudo o que precisamos. E é nesses momentos que parece que o mundo estreita sobre nós e o volume é posto no máximo...

Por falar em máximo, o texto está over the top...

Anonymous said...

Se pudesse dava-te todo o silêncio de que precisas. Hum... gostava de saber que dia foi esse... quero dizer, o dia que retratas aí no texto.
Bom, silêncio agora não vai ser possível, me is going to phone you... (este inglês não me parece nada bem...)

Raistlin The Wizard said...

...

É todo o silêncio que te posso dar...

Alice Barcellos said...

Adorei!