Sinto o aroma das páginas. Não é doce, não é amargo. Não cheira a rosas nem a espinhos. Cheira a outros tempos. A outras pessoas. Cheira a outras mentalidades. Cheira ao tempo em que se lia [muito]. Cheira ao tempo em que apenas poucos tinham televisão, em que a maior parte das pessoas alumiava a sua vida através de candeeiros de petróleo ou talvez querosene. Sinto mais uma vez o odor que emana. Cheira a viagens feitas em comboios, antes de haver uma linha que atravessasse o país de ponta a ponta.
Parece que toma vida nas minhas mãos e me desafia, a mim, a uma viagem. Viro a capa, de um material semelhante ao papel, que parece revelar anos de uso [e abuso]. É amarela e não gosto de amarelo. Mas aquela é a cor daquela colecção inteira. Já não devem existir muitos daqueles.
Olho para o título escrito da contracapa com uma letra quase cheia de sans-serif. Por detrás de mim o staccato de Mozart refugia-me em outros tempos. À minha frente, um livro cuja idade tento descobrir. A Mulher de Branco, de Wilkie Collins. Já era a terceira edição. A vinte escudos. Eu comprei-a a cinquenta cêntimos numa daquelas feiras de velharias. Pouco abaixo vem a idade. Século XIX, é quanto basta dizer. Escrito em 1860, mas com uma escrita e um estilo modernos, sem se separar do clássico. Fico confusa, mas inicio a leitura.
Quando dou por mim já os pássaros cantam e já o sol ameaça despontar. E já o livro está a páginas do fim...
«... Decorria o último dia de Julho. O Verão, quente e prolongado, estava a aproximar-se do final e nós - os exaustos peregrinos das ruas de Londres - principiávamos a pensar nas nuvens sombrias, cobrindo as searas, e nas brisas do Outono, soprando sobre a costa.»
«A linda expressão dos belos olhos azuis, a suavidade da voz quando me interrogava sobre o emprego das cores prendiam-me mais do que a paisagem, os cambiantes de sombra e luz que se confundiam do ondular da erva e na areia da praia. A capacidade para apreciar as belezas naturais só é exercida quando a nossa mente se encontra despreocupada. Os actractivos da Natureza não interferem nos nossos interesses, nas emoções felizes ou amarguradas, nas nossas experiências pessoais de todas as horas. Tudo quanto nos faaz vibrar, tudo quanto o nosso coração apreende, tanto pode ser sentido no mais pobre como no mais belo panorama que na terra possamos encontrar. Tem isto, por certo, uma razão oculta, talvez a disparidade existente entre o destino do homem que é imortal e o da esfera terrena, votada à destruição.»
Não me sinto capaz de juízos de valor quanto a este livro. Queria apenas que não terminasse... por isso leio uma frase de cada vez, degustando cada palavra como se o tempo pudesse parar e todas as coisas que tenho para fazer pudessem ser adiadas indefinidamente.
"Happiness is a sad song..."
14 comments:
Fogo!!! Diz me onde compraste que eu já lá vou!
Hum, creio que há um musical sobre esse livro. De qualquer forma, acho que Wilkie Collins é excelente para research... cheio de descrições e daquele "linguajar" interessante que, se o assunto não for interessante, torna a leitura um pouco enfadonha... parece que não é o caso...
E a minha lista como é que vai?
Diga-se de passagem que devias era dormir em vez de ler. Mas conhecendo-te como te conheço compreendo que não consigas viver sem ler xD
Pela foto não parece ser assim tão antigo o livro... o b&w favorece muita coisa =P
Eu um dia li um livro que julgo chamar-se: "uma mulher naquela casa", mas não consigo encontra-lo. Por certo nem é esse o título, devo ter imaginado o título, mas gostei tanto daquela história....uma história de amor na Munique reconstruida da Guerra cujo casal era uma mulher e um monge, ou frade, ou padre, nem sei bem. Sei que no final eles casam-se e ele é noivo e padre ao meswmo tempo. Um livro que li nos anos 80 e ...não sei dele. Este post lembrou-me esse livro. É bom, não é?
E como dizia o poeta: "primeiro estranha-se e depois entranha-se"
Tenho que lê-lo! Obrigada pela sugestão :D
beijinhos
Foi bom estar aqui, pensar e sentir contigo...Tão bom, que voltarei...
Bjs.
Passei para te conhecer um pouquinho melhor e, para te deixar um desejar de uma óptima semana mais um beijinho prateado lá da minha lua
SOL
Excelente sugestão. Concordo em absoluto com o que escreves sobre este livro - mas poderia ser outro -
Como é possivel algumas pessoas não teem hábitos de leitura? Muitas vezes me interrogo sobre.
A propósito, um dia gostaria de te oferecer o último que publiquei.
Para breve, muito breve, outro.
Beijo
Há livros assim... que nos transportam para uma realidade paralela, na qual nos perdemos horas e horas...
Beijos
Para ti que me visitaste
Ao longo destes poucos meses
Ofereço-te uma prenda singela
Uma estrela de mil cores
Roubei-a ao firmamento
Deposito-a na tua mão
Para que neste Natal
Te ilumine o coração
Um Santo e Mágico Natal
Doce beijo
Como eu gosto de passar por aqui e me deleitar com a tua brincadeira de palavras e de sentimentos que despertas nos leitores:)*
Espero que este Natal
Seja muito especial
Que tenhas a melhor prenda:
Ser feliz para toda a vida!
Boas Festas te desejo
E deixo-te um terno beijo
Post a Comment