quantos indecisos andam agora por aqui

Sunday, May 24, 2009

Doce


La petite fille de la mer - Vangelis


Às vezes gostava de não ter esta estranha necessidade de escrever sobre tudo e mais alguma coisa. Por exemplo, deixar as memórias instalarem-se suavemente, sem ter de as escarafunchar em palavras sem valor que se note. Por mais que queira resistir, há coisas que ficam tão mais doces em caligrafias cursivas, a tinta preta numa folha de papel ou num diário de capa de camurça preta já meio cheio [ou meio vazio - depende do estado de espírito]. Ou num bloco de notas virtual, onde se retificam alinhamentos e espaçamentos, tipografias e tamanhos num layout escolhido a gosto [que é exactamente o que estou a fazer].

Gostava de guardar apenas em lembranças tardes em que se tem tempo para tudo, menos para se ver filmes; em que ficam presos às almofadas os cheiros e os suspiros; em que se colam à pele os beijos e as palavras; em que se confunde o sonho e a realidade, debaixo de um céu estrelado; em que o mundo fica fechado lá fora, a sete chaves, senão mais; em que o sabor que fica na boca não é só o meu; em que as gargalhadas se soltam de mim ao som de onomatopeias trancadas na pele; em que o calor chega de fora até ao coração ou até à alma.

Talvez escreva para nunca me esquecer que há dias como este e que há emoções assim. Ao escrever, os sentimentos ficam agrafados à memória e é difícil que saiam. É isso.

"Happiness is a sad song..."

3 comments:

aquelabruxa said...

sim, escrever é gravar os acontecimentos para sempre, também tenho essa necessidade. e parece que depois de os escrever já posso esquecê-los na memória (que, coitada, já não dá para tudo), sabendo que os tenho guardados de outro modo.

Daniel Luís said...

A tua escrita é tão docemente poética que até me provoca deliciosos arrepios neuronais e outros que tais...

m said...

que somos nós sem as palavras? :)
beijinhos