não sou muito de dizer 'eu' no início de uma frase. gosto de falas sem sujeito definido. a indefinição é uma bênção e não devíamos tomá-la como maleita, mas isto sou apenas 'eu' a dizer - sim, digo-o em voz alta enquanto escrevo. há qualquer coisa que não bate certo e tampouco soa bem quando falamos de nós, faz-me lembrar confessionários e diálogos forçados, frases que nos arrancam e lá vamos dar com elas nos lábios, a escorrer de desdém como fugitivos a troçar do carrasco. o inverso é a mesma coisa - o que nos dizem sem solicitação, sentimentos que não pediram partilha e comentários que não acrescentam nada de novo, especialmente - e talvez apenas só - quando não conhecemos quem no-los conta. o 'eu' soa-me mal nas minhas e nas frases dos outros, especialmente quando é seguido de algo íntimo que nos causa repúdio. tudo isto sem exemplo soa vago quanto baste.
disso gosto, da indeterminação. se me dissessem "'eu' sou indeterminado" ficaria indecisa, sem saber se gostar ou detestar. devia existir no dicionário a palavra vaguidez. da determinação só gosto nas frases lamechas e dos objectivos, fazer isto ou aquilo, gostar disto ou daquilo. ou não gostar. do tipo eu não gosto de segundas-feiras, especialmente quando o domingo foi bom, ou da sombra quando o tempo não aquece a pele o tempo suficiente para que não sintamos frio.
por falar nisso e a propósito do trabalho que agora estou a fazer, devo dizer que cada palavra tem vários sentidos. por outras palavras cada mundo tem vários mundos. logo: a escolha de palavras não é casual, pelo menos a minha não é e se escolho uma palavra em vez de outra e me vêm dizer que devia ter usado outra, fico triste. é sinal de que não perceberam o sentido do que eu queria dizer. isto acontece especialmente com pessoas que não sabem que as palavras são um universo. para essas pessoas preto é só preto, não pode significar estado de espírito ou noite. não me lembro de nada mais triste neste momento.
acho que tenho de me habituar à indefinição demasiado linear do mundo. quando digo mundo, refiro-me às palavras que são usadas hoje em dia. são essas e só. devia parar de chamar as coisas por outros nomes, complicar frases fáceis só porque assim ficam mais bonitas e metaforizar as coisas. se vamos ser comuns, sejamos comuns. portanto neste momento gostava que o mundo fosse mais bonito e é isso mesmo que estou a dizer.
habituo-me facilmente a isto. a tudo, melhor dizendo. até ao desapego [ou talvez devesse dizer especialmente ao desapego]. à moléstia também. molestiamente desapegados, são assim estes dias que vão passando, com o calor a zombar da primavera. já não existe meio-termo neste mundo [não falo apenas do meu].
"happiness is a sad song..."
6 comments:
'Eu' sou indeterminado.
Vá, gostas ou não gostas?
Olha que vaguidez pode levar a lapsos de leitura. Nunca se sabe no que é que as pessoas vão pensar.
Soas deprimida. Ou melhor molestiamente desapegada. Normalmente é falta de atenção. Ou excesso. Estou confuso. Devo dizer que continuo a gostar das tuas analogias metafóricas e ainda estou à espera para ler a reportagem. Palavras da palavra ficava melhor do que mundos do mundo, não? Ficava mais comum muahahaha.
Beijo meu*
se gosto ou não, estou indecisa.
estou sim, 'eu', isso, mas sem causa(s) ou consequência(s) definida(s).
sim, palavras são mundos portanto ficavam melhor, mas eu não quero que fique melhor, quero que fique como está. agora vai dar graxa ao cágado, sim? =)
beijinho*
Nunca deixes de nos presentiar.... com o que tu chamas de frases complicadas...
São elas que te tornam tão especial...
Quanto ao seres indecisa... não é defeito é feitio, ou qualidade!?? Não sei estou indeciso ;)
bjt
Querida, pára de pensar por um momento e come um chocolate.
Olha o teu trabalho não é escrever? Então não percebi o teu título.
querido/a anónimo/a, eu até a pensar como chocolate. enquanto escrevo também, como agora, que tenho à frente uma tablete de chocolate de leite com 113 calorias cada cinco quadrados (pelo menos é isso que está lá escrito, mas eu não percebo muito destas coisas por isso acredito). quando ao título apenas digo que há escrever e escrever.
Molestiamente desapegados, hmmmm!
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