quantos indecisos andam agora por aqui

Saturday, December 22, 2007

[aquilo que ficou II]

E então jantar. Sozinha, era a minha perspectiva. Mas eis que se faz companhia aquela voz quase irritante, mas que naquela noite se fazia macia apenas porque queria conselho. Não o nego a ninguém, mesmo a quem não gosto ou faço por não gostar. Temos características em comum. E depois? A voz de quase barítono sussurra imperceptibilidades insustentáveis à minha alma fragilizada pelas circunstâncias [da chuva e do nevoeiro, das lágrimas e da dor]. Faz por se sentir útil, mas não preciso. Não preciso! Televisão num volume próximo do máximo. É Inverno e está a chover, mas não oiço a chuva bater nas janelas. Podia ser Outono outra vez. Fazem-me falta as folhas no passeio, secas e de sons crepitantes. Agora jazem molhadas e mortiças pelos passeios. Fazem ruídos quase surdos de superfície molhada pisada por solas inquietas e apressadas. Todos os dias, todos os dias. Não sentir o pensamento encadeado apenas porque se perde em pormenores desmotivantes, de raciocínios que me deixam em êxtase incrédulo. Quero ser livre, livre dos pensamentos.

Não percebes o que quero dizer, mas acenas em concordância. Não queria que concordasses, nem que percebesses sequer. Ouvir, também não. Não quero. Prefiro que te vás embora para não me habituar à tua ajuda. Sem ela sinto-me desprotegida, claro, mas muito melhor. E continua a tua voz de barítono que deixas chegar a um tom tão baixo que quase tenho de ler nos teus lábios as incongruências da tua lógica pseudo-racional.

Podia ser que sim, que a chuva batesse nos vidros e amordaçasse o desejo de ir dançar e sentir as gotas na pele quente. Não quero parecer ingénua, mas livrar-me das mágoas apenas exige sacrifício interior. Posso dançar à chuva enquanto me sinto triste. Nos batimentos, nas pulsações, nos assobios desengonçados de quem tenta trautear uma música com a ponta dos lábios. E insónias são inúteis, fazem-me pensar. E isso é a última coisa de que preciso. Devanear por aí é melhor, mas se for em conversas. Ouvir as folhas dos passeios é no que penso quando oiço a tua voz. Não quero parecer brusca, mas já disseste tudo o que querias? Se estou ocupada? Sim, quero escutar o meu coração. E imitar a melodia que sai dele. Para depois me esquecer e ficar com a sensação de vazio. Quando sinto o vazio é porque há mais espaço para preencher. Uma pessoa foi apagada? Não, mais espaço surgiu do vácuo sentimental. Não sei como nem porquê.

O silêncio surge do nada e parece que o ar se tornou mais doce e puro. A televisão foi apagada e a chuva parou. Também se calou o meu coração com o toque da tua alma. Por momentos fui o que já tinha sido, por momentos quis ser o que nunca fui. Nunca fui condescendente. Queria ser, mas não consegui. Tolerei ou abandonei, disfarcei em sorrisos forçados ou desfiz em expressões sem sentimento. Por mais que sentisse o teu coração nas minhas mãos, elas apenas queriam um pedacinho da tua alma. Não compreendes o que quero dizer. É que não é disso que queres falar, pois não?

Fico sem resposta, mas do teu bolso sai uma folha. Daquelas castanhas. Que costumam cair no Outono. Ainda por amachucar [a folha e a minha alma renovada].


"Happiness is a sad song..."

11 comments:

Anonymous said...

e é maravilhoso e mais do que delicioso sentir-te na minha alma. ver como a tua escrita melhora, quando me parece que não é possível melhorar.

Anonymous said...

Feliz Natal. Deixo uma folha de outono na tua caixa de correio.

Carlos said...

Olá
Em primeiro, quero-te agradecer pelos teus escritos tão doces e profundos.
Adorei este escrito, é lindo, forte, mas ao mesmo tempo sonorizado por uma melodia interna de sensibilidade.como mais uma vez te entendo,
deixa que a chuva bata na vidraça do teu «ser», da tua alma e te encante em melodias de paz , prazer e doçura.
escuta sim , teu coração e deixa te embalar pelas suas notas ,que entoam baladas de serenidade.
também no silêncio encontramos a saída e a resposta...
o silêncio é um estado de alma...muito forte, e
quando dois seres até no sil~encio conseguem comunicar se tornam cúmplices de loucuras e desejos infindáveis.
gostei imenso..obrigado

já agora obrigado por me teres dado o prazer de poder adicionar-te ao meu pasquim

bj

Gi said...

Já ontem te li e não consegui comentar. belíssimo o teu texto . Um misto de leveza e profundidade. Gostei do tempo que aqui passei.

Um beijinho e já agora votos de Boas festas para ti e para os que te são queridos.

lua prateada said...

Oi linda !!!
Passei deixando cair uma chama de amor lá da minha lua que me recomendou para te desejar um belo e feliz Natal
Beijinho prateado com carinho
SOL

m said...

UAU! Amei. De verdade. Muito sentimento que anda por aí.
Um grande beijinho
e Bom Natal!
:D

FM said...

Nem que seja apenas um pretexto... Mas, faz-te um pequeno favor, usa o NATAL para fazer alguém FELIZ. Acredita que HOJE há alguém que sentirá de Especial forma o teu gesto, a tua palavra, o teu olhar... Natal também é olhar para o outro e não apenas para as montras...
FELIZ NATAL para TI, para os TEUS e para aquele a quem hoje também estenderás a tua ATENÇÃO...

.diana.alves. said...

Então, que a chuva nunca páre de cair no teu mundo, para que possas dançar nela sempre que a tristeza te bater na vidraça.
Não penses. Devaneia somente em palavras soltas que nos prendem o olhar.
Continua a escutar o coração e a imitar a melodia. Alcança-lhe o ritmo e apanha o toque da alma que queres.
Gostei muito. Como sempre*

Anonymous said...

Não há nada mais bonito do que ouvir a sinfonia do coração...
________________

Mais um ano está a acabar
E venho aqui para te desejar,
Com um largo sorriso afoito,
Um grandioso e feliz 2008!

Boas entradas, boas saídas e um excelente prato principal!

Beijos

lua prateada said...

Minha lua desceu
Veio visitar seu povo
Ela veio desejar-te
Um Feliz ANO-NOVO!!!

A ti ela deseja
Saúde, paz e amor
Ao mundo...
Que cesse a dor!...

Beijinho prateado com carinho
SOL

m said...

FELIZ ANO NOVO!!!
Beijinho ;)