Hoje fui eu a convidar. Vamos tomar um café?, perguntei. Estava mesmo a precisar. Da cafeína e da tua companhia. Há dias em que ando distraída e me esqueço; no entanto, há dias em que parece que não consigo fazer nada sem um gole de ti. Há dias em que não passo sem sorver sofregamente os pensamentos que despejas de forma melódica e hipnotizante. Já te disse que gosto de ouvir a tua voz? Já te disse que podia ficar horas contigo, a olhar pela janela ou para o vazio do tempo que passa demasiado rápido para que eu possa deixar o teu cheiro ficar na minha pele?
Há momentos que gostava de congelar na memória. Hoje sinto o aroma de tempos saudosos, que já foram, e por mais que tente distinguir os vários odores, tudo me cheira a nostalgia. Ligo o rádio e oiço músicas que me acompanham desde a infância. E logo sou invadida pelo cheiro, o cheiro do que já passou. O cheiro do que já passou e nunca mais voltará, a não ser na memória. Queria guardar tudo, tenho medo de me esquecer de momentos importantes.
Desculpa estar a vaguear pelos pensamentos, é destes dias, é do tempo, talvez seja da chuva e do nevoeiro, talvez seja de mim ou de ti, ou de nós. Aqui. Quando convidei não pensei que fosses recusar, mas talvez tenhamos pensamentos diferentes, porque quando alguém me pergunta se quero ir tomar um café, oiço a questão como um pedido para conversar ou um pedido de companhia, nem que seja pelo tempo que se demora a beber uma chávena, daquelas pequenas que se vêem vazias, pelas mesas, com marcas de batom e cinzas de cigarro nos pires [o que agora é raro, desde que impuseram a lei]. Quando me perguntavas ou convidavas para o café, se calhar só querias companhia para o silêncio, porque ele era demasiado pesado para o suportares sozinho. Adivinhei?
Parece tudo tão fugaz e efémero, cada instante parece uma fotografia tirada com uma daquelas máquinas instantâneas. Se ao menos pudesse ir guardando os momentos no bolso! Juntá-los-ia numa caixa, numa grande caixa que pudesse estar sempre comigo, para revisitar velhos instantes, para me lembrar de sorrisos e de olhos, de brilhos e de expressões, as expressões dos que me acompanham.
Mas não são as fotos que eu quero manter comigo, são as pessoas que fazem parte delas. Queria guardar-te para sempre, mas não posso. Queria estar perto de todos, mas não posso. Queria recordar para sempre vozes, aquelas que já me sussurraram conselhos e palavras calmantes, aquelas que já me embalaram, aquelas que já me beijaram sem me tocar. Queria estar sempre, sempre… e queria não ter imaginação, para não ter de distinguir a realidade dos meus próprios pensamentos. E queria que fosses tomar café comigo, hoje.
Nunca te tinha convidado. Nunca tinha ganho coragem para retribuir os teus gestos, nunca deixei de recear estar a interromper o que tinhas para fazer, nunca pensei que gostasses das conversas, daquelas palavras fúteis que vou soltando para preencher os vazios de conversa. Hoje disseste que não, que tinha de ficar para outra altura. Tinhas alguma coisa para fazer? Talvez um outro encontro, uma outra conversa. Um outro alguém que também goste da tua voz? Um outro alguém cuja voz gostes de ouvir?
Pensei que me contasses tudo, realmente pensei. Mas as poucas horas que fomos preenchendo, como um fio imenso para o qual enfiamos contas e mais contas de palavras que se vão entrelaçando, não chegam para conhecermos as vidas um do outro. Talvez não cheguem sequer para conseguir saborear cada gota de café.
Sento-me à janela, como sempre, com mais amigos. Não gosto deste café, faz-me falta o aconchego do outro, naquela esquina. Perto dos vendedores de castanhas e daquelas árvores cujo nome ainda hei-de saber, e perto do jardim e do movimento que parece não chegar a nós, porque as vidraças embaciadas nos protegem do mundo lá fora. Sinto o aroma forte do café e logo me sinto mais desperta. Hoje dormi mal porque tinha exame e parece que o meu pai tem razão quando diz que eu faço mau contacto com aparelhos, principalmente quando estou chateada ou nervosa, porque a luz faltou e o exame foi anulado, e agora, e agora?, como é que vai ser, quando o vamos fazer? Não sei se foi sorte, se foi azar, apenas fiquei submersa em pensamentos, no meio daquela escuridão que não é bem escuridão, é lusco-fusco, a pensar se adiar a data não iria intrometer-se com todos os outros planos para este mês e para o próximo, a pensar sem raciocinar, afinal tinha terminado de calcular o EBITDA, e estava a tentar calcular a percentagem de crescimento da Cofina no primeiro semestre de 2006 e 2007, contas e contas, detesto contas, mas estava embalada no ritmo da máquina de calcular.
Quando chega o meu café dou a minha saqueta de açúcar à M., porque ela precisa sempre de duas e eu não gosto de nem um grão doce, nestes dias, no café. O gosto bruto faz-me lembrar a brutalidade destes dias. Gosto deles bem cinzentos, mornos a atirar para o frio, sem chuva ou com chuviscos agudos, que parecem picar ou fazer cócegas, de preferência com folhas castanhas e estaladiças a pejar os passeios.
Em dias como este o Porto parece mesmo o Porto e o Douro faz-me lembrar uma enorme e gelada placa de aço fundido pelo sol, quando conseguimos sentir os laranjas a mergulhar na água, pouco antes do fim do horizonte. Está frio para visitar o Douro, talvez na próxima semana, mais calma, com mais amigos. Visitar o Douro sozinho é convidar a melancolia, é convidar lágrimas que não fazem cerimónias, é convidar recordações que se querem guardadas no fundo da caixa de lembranças.
Por hoje deixo-me ficar, no café, em boa companhia. Fazem falta dias assim. Conversar sobre banalidades e deixar passar as horas, sem sobressaltos nem inquietudes. Pode ser que da próxima vez me possas vir para discutir os nossos temas preferidos. Tenho saudades das nossas vozes misturadas em músicas ambiente daqueles sítios que já fazem parte de nós e dos quais nós já fazemos parte. Há quanto tempo? [parecem anos]
7 comments:
És perita em transformar emoções em palavras ou palavras em emoções. Talvez as duas nem sequer se possam separar e tenhas de as colocar juntas... mas a verdade é que não me canso de te ler, de tentar ouvir a tua voz embalar-me com estas tuas palavras que nunca ouvi na boca de mais ninguém...
Se a ti te ajuda escrever para desabafar, a mim ajuda-me ler as tuas palavras para me acalmar.
Luna continua, podia ouvir-te a noite toda, um dia todo...
Tu e essas músicas que mais ninguem conhece... gostei desta, realmente... vou ao google descobrir mais =p
Quanto ao texto... bom, deixo as palavras a teu cargo, que foste mesmo talhada para as escrever...
Olá
Mais uma vez consegues eriçar, tanto a minha pele, como também agitar os meus neurónios em vibrações tão fortes.tocas também .bem no íntimo de meu ser, porque me revejo em ti, (na tua sensibilidade ).embora «cota» ainda hoje tento manter a sensibilidade, me fazes voltar uns anos atrás , onde eu também sentia bem á tua maneira.
Deleito-me ( permite a expressão ) em ti, parece que te oiço.
Se mo permites, não deixes de correr, na estrada das emoções, na intensidade dos sentimentos sem limites, e todas as memórias sejam elas lá quais forem, Tiveram ou Têm o seu lugar e fazem parte de nós.
embeleza a tua alma( ou seja lá o q for )em odores e perfumes de encantamento.
podem até ser( hoje ) de desencontros, mas amanhã serão encontros em ti , de uma loucura em prazer e felicidade.
Vou parar , pois não quero de modo algum ocupar o teu blog com estes meus flashes, ehheh, mas gostava de te dizer muito, muito mais , talvez porque já vivi o dobro de ti e também já tive amores e desamores, q me fizeram sofrer...
mas continuo a acreditar no amor, na conquista , no prazer , numa conversa louca seja ela na mesa de um café seja lá onde for.
VIVE , PARTILHA,AMA ,SENTE , E EMBELEZA TUA VIDA EM EMOÇÕES FORTES DE PRAZER E LOUCURA.
Acabei, desculpa , já começava a acelerar....desculppppppaaaaaaaaaaaa
P.S
obrigado por lá ires ,áquele meu pasquim de estrada,
é verdade não te autorizo a tratar-me senão por «tu».
bj
É como levar uma facada nas costas não é verdade? Não sei porquê mas todos nós tememos por um ''não'' como resposta a algo que ansiamos e que precisamos há algum tempo. Adiar adiar.. o coração não espera nem suporta isso, certo?
Mas uma boa conversa de café traz-nos alegria e paz... se ficou adiado.. talvez seja assim que tenha de ser.. talvez seja nesse dia, próximo de certo, que essas emoções por que tanto esperas tenham que vir. Hmm.. o café saberá muito melhor! Não desanimes :)
Beijinhos grandes ********* :D
Como de costume fico extasiada com as tuas palavras... Esta tua capacidade de dizer por palavras bonitas aquilo que eu provavelmente diria entre irritação (e quiçá palavrões, porque afinal estamos a falar de mim) dá-me sempre uns minutos de calma em que aprecio cada palavra...
btw se precisares de companhia para o passeio pelo Douro... ando a precisar de companhia nos silêncios...
Beijo**
Resultados da Cofina? EHHEHEEH faz bem as contas à contribuição do Jornal de Negócios. eheh
Aquele beijinho
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